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segunda-feira, 24 de novembro de 2008

René Magritte, A reprodução proibida. (1937).


"A imaginação não é, como o sugere a etimologia, a faculdade de formar imagens da realidade; ela é a faculdade de formar imagens que ultrapassam a realidade."
BACHELARD, Gaston. A água e os sonhos. São Paulo: Martins Fontes, 1968. pp. 17-18.
A UFMG propôs aos candidatos na segunda fase de seu vestibular de 2003 que realizassem a análise de um quadro de René Magritte em uma correlação com uma citação de Gaston Bachelard.
Inicialmente e sem medo de errar, o aluno deveria afirmar sobre a íntima relação que se estabelece entre o quadro e a citação propostos à análise do candidato, posto que o quadro retrata a livre possibilidade de se reproduzir por meio de pinturas aquilo que é real, bem como, reproduzir imagens que ultrapassem os limites do real, tal como no quadro em questão.
A imaginação já foi, em outros tempos, extremamente rechaçada pela tradição filosófica. Ainda há aqueles que insistem em desconsiderá-la, por uma preservação de tudo aquilo que julgamos racional. Nesse sentido, a imaginação perdeu o seu sentido, porque se distancia da realidade, como é percebida na crítica empirista de David Hume, inglês do século XVII.
No entanto, a imaginação também teve defensores, como Jen-Paul Sartre, pensador do início do século XX.
Sartre, pensador marcado pelo desespero da I e II Guerras Mundiais, observou na imaginação um caráter extremamente positivo, uma vez que a imaginação trabalha com idealizações. As idealizações são extremamente importantes, no sentido em que nos oferecem os subsídios para julgarmos a realidade.
É óbvio que aquilo que mais interessa à UFMG é analisar a construção textual do candidato da 2a. fase de seu vestibular para Direito. Outrossim, o aluno poderia construir seu texto a partir da crítica de Platão à mímesis, ou, ainda, da sua defesa, enquanto detentora de caráter um pedagógico, tal como vista por Aristóteles.
Uma proposta para julgarmos se a imaginação é inocente ou vilã pode ser encontrata a partir do filme "El laberinto del fauno", de Guilhermo del Toro, 2006. Vejamos a análise que o crítico de cinema Sílvio Pilau faz do filme sugerido, em 10/12/2006, para o site http://www.cineplayers.com/:
"Escrito pelo próprio cineasta, O Labirinto do Fauno conta a história de Ofélia, uma garota que se muda com a mãe grávida para uma espécie de quartel-general de seu padrasto, um capitão do exército espanhol. Com a Guerra Civil já encerrada, o capitão caça os últimos rebeldes pela região, enquanto sonha com o nascimento de seu filho. Enquanto isso, Ofélia descobre um labirinto perto do local que o leva a um fauno, criatura mitológica meio homem, meio bode. O ser revela a Ofélia que ela é, na verdade, a princesa de um reino subterrâneo e, para retornar ao seu palácio, precisa completar três provas.
Podendo ser classificado como um conto de fadas para adultos, O Labirinto do Fauno é uma obra de poderosa imaginação, uma fábula sombria sobre fantasia, realidade e ingenuidade capaz de seduzir até os mais céticos espectadores. Visto pelos olhos de Ofélia, o mundo de O Labirinto do Fauno é um lugar onde os seres mais ameaçadores e perigosos são os humanos. O reino da fantasia da garota, por mais perigoso que possa parecer, é muito mais seguro do que “mundo real”.
Neste sentido, é interessante que Guillermo Del Toro narre toda a sua história pelo olhar da criança. Para ela, o local mágico que descobre é uma espécie de fuga da crueldade da vida. As diferentes reações de Ofélia aos acontecimentos são visíveis: no palácio de uma criatura estranha (e assustadora), a garota parece não sentir medo, inclusive quebrando algumas leis; por outro lado, o pavor da jovem é perceptível quando está perto do seu padrasto, em um sutil exemplo da dicotomia entre realidade e ficção proposta por Del Toro.
Além disso, o roteiro é inteligente ao manter a ambigüidade da história, dando espaço para que o espectador tire suas próprias conclusões sobre o que é real e o que não é. Desta forma, ao opor de maneira perspicaz os dois “mundos”, Del Toro consegue oferecer dimensão maior a cada uma das histórias, fazendo com que a trama real eleve o aspecto fantástico e vice-versa. Como se não bastasse, a direção é hábil na narrativa, mantendo as duas tramas interessantes e evitando que apenas uma se destaque, o que poderia arruinar o filme.
O Labirinto do Fauno ainda ganha com uma galeria de personagens interessantes e bem construídos, que levam o espectador a acreditar em tudo aquilo. Além de Ofélia, interpretada com talento e delicadeza por Ivana Baquero, Maribel Verdú se destaca no papel de Mercedes, transformando-a em uma pessoa real, inclusive capaz de atos de crueldade quando provocada. Enquanto isso, a construção do personagem do capitão surpreende. À primeira vista apenas um vilão caricato, ele ganha profundidade e complexidade à medida em que a trama se desenrola, tornando-se, ao final, uma figura trágica, embora odiosa.
E não é só em relação ao capitão que o roteiro demonstra inteligência. Del Toro aproveita a escapada das engrenagens hollywoodianas para levar sua história por caminhos nem sempre do gosto da platéia, inclusive tirando a vida de personagens “queridos”. O argumento de O Labirinto do Fauno ainda conta com belos momentos de inspiração, como a metáfora da rosa – uma cena, aliás, impecável também visualmente.
Reforçando esta beleza estão as impressionantes criações cenográficas. O próprio labirinto do título, o palácio do rei e a “sala de jantar” da criatura com olhos nas mãos são belíssimas concepções, muito bem exploradas pela câmera Del Toro. E, claro, não posso deixar de comentar as próprias criaturas, em especial o próprio fauno e o apavorante anfitrião do jantar, um dos seres mais brilhantemente grotescos que já assisti numa tela de cinema.
Repleto de lirismo, inteligência e tristeza, O Labirinto do Fauno posiciona-se como um dos melhores filmes do ano. Guillermo Del Toro faz o espectador lembrar-se da importância da imaginação e da fantasia, seja como fuga da realidade ou como forma de recusar-se à obediência robotizada. Tanto para Ofélia quanto para o cineasta, o mundo mágico é mais agradável que o real. E, pelo menos durante as duas horas de O Labirinto do Fauno, o espectador acredita nisso."
Fica a proposta...

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